No caso dos autos, um ex-funcionário da empresa vítima, atuante no ramo de turismo, em associação com os outros dois agentes delituosos, teriam simulado contratos de parcerias com empresas terceiras, com a intenção de obter para si vantagens ilícitas, a saber: passagens aéreas e reserva de veículos e hotéis. De acordo com inquérito policial, o estelionatário fazia uso próprio de tais passagens, bem como as repassava para terceiros, obtendo o proveito do crime. A empresa vítima possui sede em Brasília/DF, contudo o ex-funcionário apontado como estelionatário trabalhava como representante comercial na filial localizada no município de São Paulo, onde os golpes teriam sido praticados em conluio com outros dois agentes, também residentes em municípios localizados no Estado de São Paulo.
O núcleo da controvérsia consiste em definir se o julgamento do delito de estelionato compete ao Juízo de Direito da 4ª Vara Criminal de Brasília/DF, considerando-se o local da sede da empresa vítima e de sua agência bancária; ou ao Juízo de Direito da Vara Criminal do Foro Central Barra Funda/SP, em razão do local onde o agente delituoso auferiu o proveito do crime.
O dissenso jurisprudencial retratado nos precedentes colacionados pelos Juízos envolvidos neste conflito deixou de existir com o advento da Lei n. 14.155/2021, que acrescentou o § 4º do art. 70 do Código de Processo Penal - CPP com o seguinte teor: "nos crimes previstos no art. 171 do Decreto-Lei n. 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), quando praticados mediante depósito, mediante emissão de cheques sem suficiente provisão de fundos em poder do sacado ou com o pagamento frustrado ou mediante transferência de valores, a competência será definida pelo local do domicílio da vítima, e, em caso de pluralidade de vítimas, a competência firmar-se-á pela prevenção".
Todavia, a inovação legislativa disciplinou a competência do delito de estelionato em situações específicas descritas pelo legislador, as quais não ocorrem no caso concreto, porquanto os autos não noticiam a ocorrência transferências bancárias ou depósitos efetuados pela empresa vítima e tampouco de cheque emitido sem suficiente provisão de fundos.
No contexto dos autos, não identificadas as hipóteses descritas no § 4º do art. 70 do CPP deve incidir o teor do caput do mesmo dispositivo legal, segundo o qual "a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução". Sobre o tema a Terceira Seção desta Corte Superior, recentemente, pronunciou-se no sentido de que nas situações não contempladas pela novatio legis, aplica-se o entendimento pela competência do Juízo do local do eventual prejuízo.
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